A denúncia nas obras de R. Trompaz

A indignação real do artista visual do Capão Redondo com a clara segregação social nas cidades dá surgimento ao seu trabalho artístico. Com seu estilo gráfico marcante, é possível compreender a crítica ao bater o olho em qualquer uma de suas obras.

Tornando evidente as diversas formas de desigualdade social, R. Trompaz opta por desenhar, de forma marcante e tem o anseio de tirar o espectador de sua zona de conforto. “Segregação Social Geograficamente Escancarada” é um de seus trabalhos que caminha até hoje. Definido por ele como algo escancarado – pelo estilo de sua linguagem gráfica.

Conversamos com R. Trompaz sobre o que o fez iniciar na arte, suas influências, seu trabalho e a crítica que ele carrega e claro, suas expectativas para o futuro. Confira abaixo:

1. Como foi seu primeiro contato com a arte e como isso influenciou sua decisão de seguir essa carreira?

Meu primeiro contato com a arte foi relativamente cedo, pois nesta época, eu estava há uns dois anos cursando o ensino fundamental. Foi em um curso que pertencia a Ação Comunitária do Brasil, no mesmo era ensinado desenho, pintura, artesanato, interpretação de texto, capoeira etc. Foi um divisor de águas, uma nova possibilidade de caminho que até então eu desconhecia. O fato de ter alunos mais velhos no curso, foi o que me motivou a acreditar que era possível evoluir no desenho. Estes alunos se tornaram uma referência viva pra mim naquele momento. E devido ao desempenho que tive aos olhos da professora e dos alunos, fui escolhido para estudar desenho aos finais de semana no MuBE.

2. Como a vida no Capão Redondo influenciou sua visão de mundo e, consequentemente, sua arte?

Apesar de toda precariedade presente na periferia, por um lado tive a sorte de crescer ouvindo Racionais MC’s, eles sempre foram meus professores, e até hoje tenho duas fitas K7 deles. Portanto, o estudo da sociologia veio muito cedo. Residir no extremo e atravessar a cidade em direção aos bairros mais estruturados/sofisticados sempre me chamava atenção, e eu passei a infância inteira me fazendo perguntas sobre questões sociais, sobre moradia, sobre a diferença gritante de um bairro para o outro. A minha pesquisa artística começou ali, mesmo eu ainda não sabendo que seria algo acadêmico e pra vida inteira.

3. Você pode nos contar mais como estudar design gráfico moldou seu desenvolvimento artístico?

Na minha concepção, não foi só o fato de estudar design gráfico, mas com certeza ter sido aluno de excelentes professores durante a graduação. Neste período, a minha criatividade foi super explorada, e ao mesmo tempo, tive liberdade para produzir muitas coisas a minha maneira. O fato de não ter ficado engessado só em ferramentas foi importantíssimo para o meu desenvolvimento, assim como, a compreensão dos professores diante das minhas escolhas que na maioria das vezes eram baseadas na minha vivência.

4. Você deu início ao “Segregação Social Geograficamente Escancarada” quando finalizou seu curso, como projeto de TCC. Qual é o objetivo dele e o que o inspirou a criar?

Este foi o nome do meu tcc/livro/projeto que no caso, é tudo o que eu vinha questionando desde cedo através do desenho/da pintura. O livro, é exatamente a forma que eu aprendi a enxergar a cidade, é uma linguagem visceral, é o meu próprio abecedário, são os meus signos que na maioria das vezes de forma metafórica denunciam o abismo social presente na cidade mais rica do Brasil. O descaso sempre foi nítido, e a minha indignação resulta na utilização da arte como ferramenta de evidenciar/denunciar.

5. Seu trabalho aborda a desigualdade social e residencial, apenas usando duas cores. Como você espera que isso impacte quem vê suas obras?

Amo trabalhar em P&B, acho lindo, e em relação às questões sociais por mim abordadas, era algo que representava um problema social desde a época do preto e branco se tratando de jornais, noticiários etc. Eu tinha um pensamento que o cérebro se esforçava mais ao analisar a obra em duas cores, e que sendo assim, eu conseguiria prender por mais tempo a atenção das pessoas apesar do avanço tecnológico, apesar da velocidade das coisas. Porém, hoje entendo que eu jamais vou ter o controle sobre isso, e a interpretação é livre, não tem certo e nem errado, são interpretações diferentes da obra e é lindo isso. Continuo fazendo obras, que independente das cores, tirem de alguma forma as pessoas de uma certa zona de conforto (sem generalizar) de achar que todas imagens devem ser muito claras aos nossos olhos.

6. Quais são suas expectativas para o futuro da sua carreira artística? Há algum novo projeto ou colaboração que você possa compartilhar conosco?

Dar continuidade na produção independente de qualquer coisa, focando não só na carreira artística, mas pensando também na possibilidade/tentativa de mostrar para os residentes dos extremos, que o caminho da arte pode ser uma alternativa interessante. No momento eu participo de uma exposição coletiva na Argentina, no fim do mês eu pouso em solo mexicano para participar da Trienal de Tijuana (minha primeira bienal/trienal) que vai até fevereiro de 2025, e no inicio de agosto, abro uma exposição individual importantíssima em SP, a qual, eu conto muito com a presença de vocês e de todos que fortalecem com energia boa/positiva.

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