Entenda como a Carhartt se tornou um fenômeno no streetwear
Não há muitas marcas por aí que podem se gabar da herança que a Carhartt pode. A marca tem se dedicado a fornecer roupas adaptadas para atender aos mais altos padrões de qualidade, durabilidade e conforto além de atravessar classes sociais há mais de 100 anos. Embora a marca se preocupe em atender as altas exigências de qualidade, a Carhartt não foi inicialmente criada para ser um fenômeno no streetwear e na cultura hip hop.
A história de Carhartt começa em 1889, quando Hamilton Carhartt deixou a escola para iniciar um negócio de móveis por atacado. Em 1898, o negócio foi tomando forma do que a marca é hoje, se tornando uma fabricante de roupas de trabalho masculinas. Apesar de falhar nas suas primeiras tentativas, Carhartt insistiu e depois de conversar com engenheiros ferroviários, descobriu a necessidade de roupas de trabalho de alta qualidade. Não demorou muito para os macacões da marca se tornarem um item essencial para qualquer trabalhador na época.
A expansão da marca decolou durante o início dos anos 1900, tendo sedes que se estendiam pelas principais cidades dos Estados Unidos bem como internacionais, em Liverpool, Vancouver, Paris e Nova York. Em 1925 a marca criou sua primeira extensão, a Hamilton Carhartt Junior - Fabricante, que se especializaria em roupas de trabalho para jovens, incluindo macacões, camisetas, calças e sapatos. Esta foi uma indicação clara do desejo da Carhartt de expandir sua gama de produtos e também uma indicação precoce da visão da marca.
Devido à Grande Depressão de 1929, período que marcou os Estados Unidos com a maior desaceleração econômica da história do país, muitas marcas sofreram para produzir e manter filiais em atividade, e para a Carhartt não foi diferente. Apesar da adversidade a marca continuou o projeto de solidificação, aperfeiçoando sua confecção de tecidos em jeans e lona bem como as costuras com linhas triplas totalmente exclusivas.
Avançando para os anos 70, a Carhartt mostra mais passos significativos na sua trajetória, com a inauguração da Carhartt South Inc, subsidiária da marca especializada em jeans. Durante as décadas de 1980 e 1990, o crescimento continuou e já atraia novas olhares do mundo todo, o vestuário de trabalho estava entrando para o mundo da moda.
Em 1991, a Carhatt, que já vendia no mercado japonês como um item da moda desde 1987, estreou suas clássicas jaquetas em desfiles de Nova York, foi o início da tendência “Workwear”.
Com seus cortes grandes e tecidos robustos, as roupas da Carhartt sempre combinaram com os ideais e a estética que sustentaram grande parte do hip hop na década de 90. Suas jaquetas vistosas davam imponência e mais atitude a quem vestisse e como uma boa parte das referências e da realidade retratada nas músicas de rap na época, a marca teve sua utilidade por traficantes, e esses sim podem reivindicar o pioneirismo da nova tendência. As mesmas propriedades que trabalhadores em fábricas e fazendas sempre viram a marca favorecendo, também se prestaram bem àqueles que se envolvem em formas mais ilícitas de trabalho, onde as noites passadas nas esquinas frias no inverno rigoroso das ruas necessitavam agasalho e durabilidade.
Poucas marcas tiveram um apelo tão difundido quanto a Carhartt nos guetos de Nova York, e isso chamou a atenção e teve a adoração de quem era porta voz da realidade nesses lugares. Durante a década de 90 rappers como Tupac, Eazy-E, Nas e o grupo Naughty By Nature, por exemplo, eram grandes exemplos de atitude e estilo, exibiam suas botas da Timberland e suas jaquetas da Carhartt durante shows e aparições trazendo atitude e o estilo “gangsta” ao público.
A adoção da marca sempre teve diferenças sutis, dependendo de que lugar a pessoa nasceu. “Em Nova York, os rappers preferem o marrom mostarda e o verde escuro, com calças largas e botas da Timberland” como observa um artigo da New York Times, que cita Albee Ragusa, então diretor de marketing da Tommy Boy Records. Em 1989, a gravadora comprou estoque de jaquetas clássicas Carhartt para bordar seu logo nelas, sequencialmente a Stüssy fez o mesmo, vendendo-a como sua própria mercadoria - e, por sua vez, criando uma colaboração de streetwear, antes que tal noção existisse.
Em 1994 a Carhartt fundou a Carhartt Work In Progress ou WIP, para abreviar, introduzindo uma seleção de novos produtos e com novos tecidos, compreendendo as exigências da moda européia. O sucesso foi imediato, a submarca se tornou querida pelos consumidores. A WIP tem em seu histórico colaborações icônicas com a japonesa BAPE, Stüssy, Patta e entre outras grandes marcas do streetwear.
Hoje, a influência da marca ainda pode ser vista. Kanye West, que já usou kilt de couro e até mascaras com jóias da Margiela, aparece em muitas vezes com algum item da Carhartt. ASAP Rocky que mostra seu lado excêntrico usando Rick Owens e Action Bronson já se declararam fãs da marca.
O fato é que a Carhartt transcende o óbvio, seja no equilibrio e contraste da excentricidade, no uso diário ou como um símbolo de autenticidade mais simples. Existem uma ou mais explicações para cada tipo de pessoa usar a marca no passado e no presente.
Texto/Pesquisa: Vitor Queiroz