O que Virgil Abloh pensava sobre criatividade?
Antes de mudar o design, antes de inaugurar uma nova linguagem que reorganizou moda, música e arte, Virgil Abloh construiu uma filosofia universal onde criatividade é acesso, processo e permissão. Ele reiterou isso em todas as palestras, entrevistas e projetos que assinou. Para entender Virgil, é preciso voltar às suas próprias palavras, não interpretações.

Sua palestra na Harvard Graduate School of Design, em 2017, é talvez a melhor síntese do que pensava sobre criação. Ali, diante de uma plateia de designers, arquitetos e estudantes, repetiu o que considerava seu núcleo intelectual: “Tudo que eu faço é para a versão de 17 anos de mim mesmo.” Criar, para ele, era uma forma de devolver ao adolescente que cresceu em Illinois a possibilidade de imaginar caminhos que ainda não existiam.
Seu processo criativo se apoiava em repetição, prática e no gesto simples de começar, onde as representações e o que seria criado, toma mais importância do que rótulos e denominações. Em palestra, Virgil afirma ao dizer “Eu não acredito em títulos, eu acredito em trabalho”, fluxo direto ao entendimento de quem entrou em um sistema de difícil acesso apenas realizando suas ideias.

Quando disse que qualquer pessoa pode ser designer, completou com uma verdade raramente mencionada no discurso criativo contemporâneo: “Se eu não tivesse trabalhado por 10,000 horas no Illustrator, nada disso poderia ter acontecido.” A frase elimina de vez a ideia de “talento natural”. Para Virgil, criatividade era resultado de repetição, experimentação, erro e prática exaustiva. Seu método era tão manual quanto intelectual.
Além disso, na mesma palestra, podemos acompanhar uma das vezes em que o designer se apoiava em deslocar algo alguns graus de algo para criar uma nova leitura. A frase mais famosa, resume esse raciocínio:
“Você só precisa mudar 3% de qualquer coisa para criar algo novo.”

Essa ideia sustentou a criação da Off-White e a maioria dos seus projetos. Quando foi ao MCA de Chicago, em 2019, para inaugurar a retrospectiva Figures of Speech, explicou seu método: “A premissa fundamental da Off-White é que tudo é uma citação.” A criação era um sistema de referências abertas, remixadas, reorganizadas. O design funcionava como DJing, outro pilar central da sua vida. No Interview Magazine, disse:
“Ser DJ é a minha forma mais pura de expressão. É como eu penso em tempo real..”
Para Virgil, design, música, arquitetura e moda eram parte de um mesmo fluxo. O que mudava era apenas o meio, e tudo isso transformava a forma como a criatividade era compreendida. O processo era sempre o mesmo: observar, reorganizar, provocar, e todo esse método não necessitava possuir uma grande estrutura.

Em 2020, no Financial Times, sintetizou um pensamento que guiava sua investigação criativa: “Eu estou mais interessado nas questões do que nas respostas”. Criar era levantar dúvidas sobre o que o mercado considerava norma. Era tensionar certezas. Era abrir caminhos. Virgil nunca acreditou em mitologia de gênio, rejeitava hierarquias, rejeitava a ideia de que criatividade pertence a poucos. No fundo, sua filosofia pode ser resumida no que disse diversas vezes, e de formas diferentes:
"O único fracasso é não tentar.”
A morte de Virgil Abloh interrompeu uma das trajetórias mais influentes do século 21, mas não interrompeu sua linguagem. Sua obra segue sendo modelo para uma geração que entendeu que a criatividade é sobre a leitura do mundo. Virgil acreditava que o futuro do design dependia de duas coisas: abrir portas e fazer perguntas melhores. E, com isso, deixou um método que ultrapassa moda e se instala como pensamento cultural.
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