BradockDan e a reconstrução através da vulnerabilidade

Nov 7, 2025

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Entre pausas e recomeços, BradockDan lança Devaneios, um álbum construído a partir das crises, da ansiedade e da necessidade de falar sobre o que ainda é visto como tabu. O projeto marca uma virada introspectiva em sua trajetória, tratando da saúde mental e da responsabilidade que vem com a palavra e o alcance.

Criado ao lado do produtor Victor Henry, o disco transforma vulnerabilidade em som. Cada faixa nasce de conversas e momentos de instabilidade, transformando desconforto em textura, incerteza em ritmo e reflexão em linguagem.

Devaneios marca um ponto de maturidade, em uma tentativa de traduzir em música o processo de se reencontrar enquanto artista e indivíduo. Confira a entrevista completa abaixo:

NOTTHESAMO: Após 2024, um ano marcante para sua carreira, você chega com um projeto instrospectivo. Como essa época, a exposição às redes e a novos públicos tem relação com sua nova fase?

BradockDan: A princípio, o plano inicial era dar segmento naquilo que já estávamos fazendo, claro que com algumas mudanças para não soar repetitivo para o público. Ao decorrer desse processo eu enfrentei uma batalha muito grande contra a ansiedade e posso dizer que uma pré depressão (caso não tivesse buscado ajuda). Eu sempre fui uma pessoa muito introspectiva e com o tempo eu fui “melhorando“ e conseguindo ser um pouco mais extrovertido, e sinto que isso foi me ajudando a criar uma relação mais forte com o meu público. Mas ainda sim, existiam alguns bloqueios as quais eu não me sentia muito confortável para me expor tanto nas redes sociais. Quando comecei a enfrentar todas essas questões sobre a minha saúde mental, eu me senti muito desconfortável em me expor e falar sobre essas situações que estava passando. Muito pelo forma como eu enxergava que as pessoas falavam sobre esses assuntos e a forma como eu sentia que as pessoas não tinham “filtro“ ou até mesmo sensibilidade para tratar de assuntos tão sérios. Mas por outro lado, foi isso que me encorajou a criar e falar sobre todos esses problemas que enfrento em forma de música.

NTS: O quanto a ansiedade e as crises foram suas companheiras de estúdio nesse processo?

BD: Posso dizer sem sombra de dúvidas que foram 100% companheiras. Eu literalmente conheci os dois lado da ansiedade. Entendi que a ansiedade pode sim ser algo ruim, mas por outro lado, eu enxergava algo bom nisso. Me sentia ansioso de forma positiva em ver esse projeto tornando forma. Mas já existiram momentos em que a ansiedade tirou totalmente a criatividade de dentro de mim e isso me levava às crises.

NTS: Devaneios — uma palavra que carrega a ideia de confusão, instrospecção e incerteza. O que esse nome apresenta sobre o projeto?

BD: Eu escolhi esse nome muito pelo forma como me sentia e como enxergava os meus pensamentos no momento de crise e de ansiedade. Já existiram muitos pensamentos na qual eu me imaginava tendo tudo o que costumamos almejar… Casa, carros, roupas bonitas e dinheiro. Mas em fração de segundos meus pensamentos mudavam para algo mais cruel e nada romantizado. Com todas essas mudanças dentro do meus pensamentos, eu criei uma narrativa para cada música onde os meus pensamentos mudavam. Então eu fiz músicas onde eu falo de coisas fantasiosas, sentimentos, incentivo e a minha percepção de mundo, tendo em vista a visão de alguém que está passando por crises e perdendo seu senso do que estar ou ser feliz.

NTS: Hoje, falar sobre saúde mental ainda é um tabu. Você sente/sentiu alguma resistência sobre?

BD: Senti, muita. Para ser sincero eu senti muita vergonha, muita pressão de escolher ter que falar ou não com o meu público sobre o que estava passando, sobre ter que explicar o porquê eu não estava aparecendo. Tudo era muito novo para mim, eu não estava entendendo e eu não queria acreditar que estava passando por uma situação tão ruim e difícil em um momento crescente na minha carreira. Escolher falar que precisaria dar uma pausa na carreira para me cuidar estava me machucando muito e me deixando muito frustrado… Não sei se escolhi ou fiz a coisa certa, mas no final das contas eu simplesmente sumi das redes sociais e priorizei a minha saúde dentro da minha realidade particular por acreditar que em um momento de melhora, eu estaria mais confortável e confiante para tratar com o público que me acompanha.

NTS: O que esse projeto muda na forma como você enxerga o que é ser artista, e o que você quer comunicar daqui em diante?

BD: Eu sempre busquei um amadurecimento como pessoa e como artista. Passar pelo o que passei foi uma forma de amadurecer e entender a responsabilidade e o poder que tenho nas minhas palavras e ações. Sei que posso aconselhar, posso dividir e ajudar as pessoas que me escutam. Eu percebi que não preciso me sentir inferior por não fazer o que os outros artistas tem feito e tem dado certo para eles. Meu propósito sempre foi mais profundo e depois de todas essas provas eu sinto que eu sempre estive no caminho certo. Quero sim explorar outras coisas, outras percepções de mundo, mas quero continuar sentindo que estou ajudando as pessoas pelo forma como acredito no poder das palavras.

NTS: Ao final, se pudesse dar uma dica a qualquer pessoa, o que seria?

BD: Eu gostaria de fazer um pedido na verdade… Eu peço que se cuidem, que se respeitem e que não sintam vergonha por estar vulneráveis. Continuem acreditando na sua melhora, porque as coisas vão melhorar se você se cuidar e se respeitar.

NTS: O Devaneios parte de um lugar muito pessoal do Bradock, mas a produção dá o corpo a isso. Como foi transformar as emoções dele em representação sonora?”

Victor Henry: Foi um processo muito natural, porque a gente já tem uma sintonia muito boa de trabalho. Mesmo à distância, quando precisava, conseguimos nos entender bem e traduzir o que ele queria expressar. As faixas nasceram das conversas e das emoções que ele estava vivendo, e eu tentava transformar aquilo em textura, em atmosfera. Cada som, cada efeito, carrega um pouco do que ele estava sentindo. A ideia foi sempre dar forma ao que ele trazia em palavras e sentimentos.

NTS: A construção do que é o som do BradockDan passa completamente pelo seu modo de produzir. Dessa vez, os motivos são diferentes, há algo muito maior pairando no ar durante a construção desse álbum, desde os questionamentos sobre fama, até as crises de ansiedade. Como foi para você acessar esse mundo tão particular de introversão do Dan?

VH: Foi um desafio bom, porque esse projeto exigia uma escuta mais profunda. O Dan estava em um momento muito introspectivo, refletindo sobre várias coisas, eu precisei entrar nesse universo junto com ele. A produção acabou virando um espaço de expressão e cuidado. Minha função foi equilibrar o lado técnico com o emocional, pra que tudo soasse verdadeiro.

Editor in chief

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