Felipe Fire: o encontro entre o skate e o luxo

Natural de Guaratinguetá, Fire é skatista há anos e conta que isso pavimentou seu caminho e seu modo de ser. A moda, nada distante dessa relação, também o acompanha desde criança. A união entre o skate “core” e o mainstream estreitam os laços de Felipe com a @gucci.

Conversamos um pouco com ele sobre sua jornada, moda, lifestyle, marcas de luxo e, claro, skate – confira no carrossel. Além disso, um editorial especial foi feito com @felipe.foguinho e @anendfor, celebrando esse momento.

Como você descreveria sua jornada como skatista até o momento?

  • O skateboarding apareceu na minha vida como uma oportunidade de ser diferente dentro do universo que eu conhecia, mas logo depois se tornou competição e por um bom tempo se manteve assim. Ele me levou pra conhecer o mundo e experienciar culturas, isso fez com que eu abrisse a minha mente. Cresci numa chácara no interior de SP, em Guaratinguetá e alguém ou alguma coisa teria que me ajudar a lapidar minha visão. Com o tempo e experiências, compreendi que competição dentro do skate é uma parcela irrisória comparado ao impacto dele dentro da sociedade e me fez voltar ao que me trouxe pro skate primeiramente, o lifestyle.

O skateboarding é uma das chaves de aprendizagem e conhecimento mais potentes na sociedade atual, a chave pro universo dada pelas ruas. Pavimentou meu caminho, me apresentou portas para vida toda e me ajuda a evoluir como ser.

Qual é o papel da moda e do estilo em sua vida, especialmente em relação à sua identidade como skatista?

  • Eu sempre me importei muito com minha roupa, desde de muito criança. As roupas que eu amava, eram do corpo pra lavagem e da lavagem pro corpo… Aprendi com o tempo a ser natural e ouvir o meu corpo, tem dia que seu corpo pede pelo azul, dia que pede pelo lilás, pelo branco, dia que tá pedindo algo só confortável ou às vezes algo super complexo, cheio de acessórios e detalhes. Então estilo no meu ponto de vista, não é estritamente como nos vestimos, mas como nos sentimos, andamos, falamos, nos comportamos, gesticulamos, dançamos, pintamos ou façamos qualquer movimento, o estilo tá ali, intrínseco, estilo nada mais é do que sua personalidade, sentir seu momento… Cada dia você está em um “humor” e assim mudamos, evoluímos e o estilo muda junto. O importante no final é estar se sentindo bem, se a roupa me incomoda, fica mais complicado andar de skate, quase impossível, parece que não sou eu ali ou que não estou sendo verdadeiro comigo, não é a minha personalidade, não funciona. Já quando me sinto muito bem com minha roupa, até aprendo manobras novas.

Como surgiu sua relação com a marca Gucci e como isso influenciou sua perspectiva sobre moda e lifestyle?

  • “Nada vem do nada”. Logo depois que entendi meu caminho dentro do skate e cultura, decidi entrar de cabeça nesse mundo. Na época morava em São Paulo e estava voltando de uma cirurgia, que acabou me tirando mais de um ano de skate. Isso me estagnou e fiquei sem perspectivas no esporte, porém me veio uma vontade muito grande de fazer pela cultura, de não largar algo que me fez tão bem e achar outros meios de fazer parte. Então, enquanto estava afastado, fui atrás de agenciamento como modelo, comecei a abrir as portas para outras marcas além do meu patrocinador, fui fazer campanhas (que me representassem e quisessem se envolver mais com o skate), visitei lugares e pessoas que me ensinaram muito e me deram um norte nesse caminho e naturalmente as coisas foram fluindo. Então, em meio desse fluxo todo em um dia como outro qualquer, recebi uma mensagem dizendo ser da Gucci e que gostariam de me enviar um presente… Hahaha no momento tinha certeza que era hacker, (pensei: Gucci?! Sério?! Esses hackers estão ligeiros demais) mas uma pulga atrás da orelha me fez procurar saber mais. Confirmei então que era quente e logo começamos essa relação. Isso foi em outubro de 2020 e esse momento foi marcante pra minha vida.

Me provou que o skate poderia me abrir qualquer porta, se eu seguir acreditando em mim e respeitando tudo e todos, posso chegar onde quer que a mente imagine e muitas vezes, onde nem mesmo, a mente imaginou.

Como você equilibra sua identidade como skatista com sua participação em campanhas e trabalhos fora do skate, como modelo e influenciador?

  • Na realidade tudo é uma coisa só. E quando me liguei disso, ficou tudo mais fácil – nenhuma delas anula a outra, pelo contrário, elas se impulsionam, te apresentam novos pontos de vista. Um exemplo disso é que depois que comecei a fazer trabalhos como modelo e influenciador, vi que eram mais leves e acabei trazendo pro skate essa tranquilidade, principalmente nos momentos de competição. Com o tempo fui aprendendo sobre como funcionam a criação e produção dentro das empresas e me surgiu ainda mais interesse em fazer parte disso, da união entre o skate “core” e o “mainstream”, que é justamente o caminho atual do skateboarding, também do funk, surf e o que o rap já faz a bastante tempo. Criei uma cápsula criativa que chamo de Flow.er e hoje também ajudo marcas parceiras com designs de produtos, ideias e tudo que o skate me ensina e que sinto falta na visão do mercado, além de fazer minhas próprias criações, que são os os shapes e algumas peças de roupa.

Por ser skatista, vivemos na rua, vivemos o “core”, querendo ou não, vemos as coisas acontecerem, antes mesmo de acontecerem e o skatista ainda é observador, rebelde e inovador, sempre foi transgressor, por isso a criatividade e criação, são latentes dentro da cabeça de skatista.

Quais foram os principais desafios que você enfrentou ao expandir sua presença além do mundo do skate?

  • Desafios somente internos – como o medo de como as pessoas iriam ver ou julgar, de não ser bom o suficiente, que não era coisa de skatista e tudo mais. Claramente não dei ouvidos a minha insegurança. Falaram e ainda falam e se eu me importasse com a opinião dos outros não estaria aqui hoje. Além de estudar muito e conversar sobre a história do skate, com os mais antigos skatistas brasileiros e de fora, descobri que o skate tem um forte impacto na moda e na sociedade desde de seu primeiro dia de vida, desde de Jay Adams, Tony Alva, Mark Gonzales, Harry Jumonji.. Até Dilan Rider, Lucien Clarke, Peter Bici, Kith Hufnagel e por ai vai! Então foi completamente o oposto: tive zero desafios. O skatista é essência e liberdade, porém com barreiras elevadas, rígidos e muitas vezes se fecha para a mudança, que já está acontecendo! Muitos querem o conhecimento que temos das ruas do mundo. Já dizia meu pai “conhecimento é caro” e nós temos o que todo mundo está atrás: a bagagem, o café no bule, a experiência, conexões com diferentes culturas e respeito. Isso a faculdade não te ensina, o diploma não proporciona e sim o aqui e agora, a vida acontecendo no coletivo, na comunidade e união, é a vida que ensina! E o fato do skateboarding estar em evidência, é porque a gente não fala muito e sim vive, sempre viveu. A sociedade está respeitando a nossa visão e se inspirando cada vez mais, nada mais justo nós estarmos no meio de tudo isso, colhendo os frutos de anos de dedicação ao skateboarding. E assim… através do insconsciente coletivo a sociedade aprende a viver com nosso exemplo, viver e ser mais, falar menos! Falar o essencial!

O mercado sempre precisou da gente, a moda se inspira na rua, se inspirou e até mesmo usou a gente, na verdade skate é fonte de transformação.

Como você vê o papel da moda de rua e da cultura skate na indústria da moda de luxo, especialmente no contexto brasileiro?

  • Streetwear é e sempre vai ser moda. Não descreditando quem cria arte e conceitos em roupas além das ruas, mas no geral todos usam streetwear e, quando todos usam, consecutivamente acaba virando moda. Isso se deve aos três aspectos cruciais (pra mim) do streetwear: conforto, utilidade e estilo. Respeitar seu corpo com uma roupa que não tire seu bem estar e te deixe livre pra movimentar, isso é conforto. Uma roupa que suporte o seu dia a dia, seja praticando exercícios, passeando, andando de skate ou em qualquer momento que um detalhe na roupa facilitou sua vida, como o tipo do tecido, bolsos, costura, fitas, botões, acessórios e todos esses detalhes que fazem a diferença – essa é a utilidade. Por último e não menos importante, tem que ter estilo, paleta de cor, silhueta, estampas e por ai vai. O skate está no centro e a indústria da moda de luxo sabe disso, estão sempre buscando trazer inovação e lucro. O skate une tudo que é necessário para elas, com a visão que eles desconhecem e a ânsia dos consumidores em fazer parte da cultura de rua, unido também ao desejo que uma marca luxuosa carrega. É a receita perfeita e, por isso, estão trazendo pra dentro das empresas pessoas que vivem esse lifestyle. Lá fora isso vem acontecendo há alguns anos já e no seu tempo está acontecendo no Brasil também. Afinal, o Brasil é rico em criatividade e designers que possuem essa bagagem para explorar no streetwear e a força dessa visão é imensa. Por isso marcas nacionais ou que não respondem a nenhuma sede gringa estão ganhando respeito e espaço tanto aqui como fora, trazendo originalidade. Um exemplo foi o “Je M’appelle Brasil” que rolou em 2023, em Paris.

O skate está no centro e a indústria da moda de luxo sabe disso, estão sempre buscando trazer inovação e lucro. O skate une tudo que é necessário para elas, com a visão que eles desconhecem e a ânsia dos consumidores em fazer parte da cultura de rua, unido também ao desejo que uma marca luxuosa carrega – é a receita perfeita.

Quais são suas aspirações e objetivos para o futuro, tanto no skate quanto na moda?

  • Seguir evoluindo e aprendendo, entrando de cabeça, ainda mais, na criação dentro das marcas, fazendo algo impactante para pessoas, que abra a mente, mostrando que a vida pode ser mais leve, repassar meus aprendizados em forma de roupas, acessórios, filmes e tudo que me ajude a transmitir a mensagem. E o skateboarding… nada mudou e tenho certeza que não vai mudar, é em cima dele que posso ver as coisas com outro ponto de vista.

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