Continuaremos comprando como se não houvesse Coronavírus?
A pandemia de Covid-19 vai mudar a maneira como consumimos moda. Ou não.
Se você mora nesse planeta e não está moscando, já percebeu que estamos vivendo uma situação nunca enfrentada antes ou, pelo menos, não nessas proporções. O Corona Vírus saiu da China numa espécie de world tour (que ninguém quer pagar pra ver) e, até esse texto ser publicado, já matou mais de 184.643 mil pessoas.
A maioria de nós, privilegiados, está trancafiada em casa, inventando mil coisas pra se manter longe do tédio e fugindo das lives no Instagram. Inevitavelmente estamos repensando a nossa relação com a família, com o trabalho, com nós mesmos e, claro, com o consumo. Muita gente aposta que, depois que tudo isso passar, nós seremos outros, mais conscientes, mais atentos e menos impulsivos em relação às compras.
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Foto: Highsnobiety
Mas será? Será que a visão de que sairemos dessa regenerados e livres das amarras do sistema não é romântica demais?
Claro que o valor do seu outfit definitivamente não devia ser o foco agora, mas pra quem gosta e está envolvido de certa forma com o assunto, é preciso refletir sobre o tema: num mundo marcado pela instabilidade (quando voltaremos a viajar? A ir em shows? Teremos um emprego no fim disso tudo?) ainda terá “clima” e circunstâncias favoráveis pra ficar na fila durante horas por um tênis?
O pensamento “é preciso mesmo comprar isso?” estará mais frequente na nossa cabeça e vai ser mais difícil arranjar justificativas pra ter gasto as economias em outra jaqueta de 3 mil reais.
A pandemia tem instalado um certo medo na gente.
Estamos pensando 2x antes de comprar uma camiseta nova (ainda que online e em segurança) porque não temos certeza sobre quanto tempo esse pânico durará e se ainda vamos ter dinheiro na conta depois de passar sei lá quantos meses com as vidas pausadas pelo Corona.
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Lançamento da Supreme com Box Logo para arrecadar fundos no combate ao COVID-19
Na Europa e nos EUA, por exemplo, mais de 65% dos consumidores esperam diminuir seus gastos com vestuário. No Brasil, essa queda já representa 78% no período de 19 de março a 1º de abril.
Mas a questão que pega mesmo é: essa mudança vai se consolidar? Passaremos alguns anos com essa postura mais consciente ou, ao primeiro sinal de “fim” da crise, nós voltaremos sedentos por compras?
No momento, estamos sim mais cautelosos. Mas não podemos ser inocentes a ponto de achar que as marcas não encontrarão formas de criar novos incentivos de consumo, numa tentativa de trazer de volta a velocidade com que comprávamos antes.
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Foto: Artyom Ivanov/Tass/Getty Images
Então, se você é marca, anota: vai ser preciso estimular as pessoas à novamente terem vontade daquilo que não é necessário, já que as estratégias previamente planejadas para 2020 já eram; e se você é consumidor: vai precisar, mais do que nunca, ter autocontrole pra não se endividar num mundo que mal saiu de uma crise.
Levando toda essa discussão pra um lado mais pessimista, pode ser que a pandemia apenas reafirme as visões de mundo que nós já temos: quem é de comprar indiscriminadamente vai continuar comprando, quem só consome marcas “sustentáveis” e locais vai sentir ainda mais necessidade de investir nisso e quem já tem como hábito comprar só quando preciso vai seguir fazendo o mesmo.
Mas vamos tentar seguir a linha otimista, afinal, nesse momento, a gente tem o que além de esperança e c* na mão?
Numa recente especulação, conversamos com algumas pessoas a respeito dessa questão – se existirão ou não mudanças no nosso hábito de consumo e se elas serão, de fato, significativas – e a maioria concordou que, talvez não aconteça nada tão radical, mas que acreditam sim numa desaceleração e que, pessoalmente, vão buscar peças mais duráveis e marcas mais responsáveis social e ambientalmente (aliás, a sua marca favorita fez algo pra ajudar as comunidades nessa pandemia ou seguiu metendo o loco e tentando vender como se nada estivesse acontecendo?).
https://www.instagram.com/p/B-pEHQ7gLv6
Bom, a fita é que não dá pra definir nada por enquanto, estamos num momento em que é complicado apostar em qualquer coisa. A nossa torcida é que a pandemia traga bom senso e responsabilidade no que tange a escolhas pessoais, mas que sabemos bem que impacta todo mundo. Nós somos capazes de nos unirmos e nos mobilizarmos não só pra consumir, mas também pra ser agentes ativos em assuntos importantes – o que vai de um post no Instagram à qual loja você vai deixar o seu dinheiro.
Não podemos afirmar se a pandemia trará valores em torno de temas como sustentabilidade e trabalho escravo, por exemplo, mas fica aqui o nosso compromisso de, pelo menos, colocar esses assuntos em discussão: materialismo, excesso de consumo e práticas empresariais irresponsáveis dentro do universo do streetwear. A conversa vai ter que se estender, ir além de tendências de cores, cortes e materiais e falar mais sobre essa busca louca por lucro por parte das marcas tendo em mente o desafio de promover uma noção mais ampla de propósito.
A sua camiseta vai ter que significar mais do que diz na estampa.
Por aqui fica o reforço daquilo que acreditamos tem uma cota: as roupas precisam ganhar novos sentidos, precisam ser transformadas em instrumentos de resistência e no elo com quem nós somos.
Esperamos que, quando tudo estiver acabado, as pessoas não continuem apoiando marcas que tiraram vantagem de doentes e menos favorecidos por todo o mundo ou que se isentaram de ajudar suas comunidades de alguma forma durante esse período.
Estamos na torcida para que isso tudo mude algumas mentes.
Bom, já seria melhor do que nada.