Nylon Prada, a transformação do luxo em 1999
O nylon nasceu nos Estados Unidos nos anos 1930, criado pela DuPont como uma das primeiras fibras sintéticas da história. Seu uso inicial estava ligado a objetos do cotidiano, mas ganhou importância mundial durante a Segunda Guerra Mundial, quando passou a ser empregado em paraquedas, uniformes militares e cordas, tornando-se símbolo de resistência e funcionalidade. Nessa época, a Prada já existia. A grife fundada em 1912 por Mario Prada, foi ter uma virada de chave com Miuccia Prada, neta do fundador, que assumiu a grife em 1978 e foi transformada. E o nylon, que nasceria 18 anos depois, foi um dos pontos-chave dessa história.

No pós-guerra, quando a produção em massa se expandiu, o nylon foi ressignificado como um material barato, associado a roupas populares, barracas, mochilas escolares e malas. Era funcional, acessível e durável, mas distante da ideia de sofisticação. Tornou-se o oposto do que se esperava em uma peça de luxo, mais identificado com consumo de massa do que com exclusividade.

Foi nesse ponto que Miuccia Prada enxergou a oportunidade de provocar um deslocamento. Ao assumir o comando criativo da Prada no fim dos anos 1970, ela começou a questionar os códigos do luxo europeu, tradicionalmente ligados ao couro, à seda e a acabamentos manuais que reforçavam a herança artesanal da alta moda italiana.

Sua proposta era explorar o nylon, material considerado banal, para transformá-lo em símbolo de sofisticação. O primeiro passo aconteceu em 1984, com o lançamento da mochila preta de nylon, que rapidamente se tornou objeto de desejo. A peça condensava a ideia de utilidade e discrição, mas em um desenho minimalista que dialogava com a vida urbana e a noção de luxo intelectualizada que Prada começava a desenvolver. Essa mochila se transformou em um marco, redefinindo a forma como se pensava o que era essencial no guarda-roupa de luxo.
Nos anos seguintes, a Prada seguiu investigando as possibilidades do nylon, trabalhando com fábricas especializadas para desenvolver versões mais apuradas do tecido. Ao final dos anos 1980 e durante os anos 1990, Miuccia refinou o material até torná-lo central na identidade da marca.

O nylon da Prada não era o mesmo das mochilas escolares ou barracas de camping, mas um tecido tratado com tecnologia que chegava a ser mais caro que a seda. O nylon se transformava em peça-chave de uma estética que unia funcionalidade e luxo, um contraste radical em uma época em que a moda de prestígio ainda orbitava em torno do couro, do veludo e da alfaiataria tradicional.
Esse processo encontrou seu auge em 1999, com a coleção primavera-verão que colocou o nylon definitivamente no centro do discurso da Prada. Nessa temporada, Miuccia apresentou uma série de peças minimalistas, esportivas e técnicas, mas trabalhadas com elegância e clareza formal. Não eram apenas jaquetas utilitárias ou calças funcionais, mas uma coleção inteira construída sobre o contraste entre material técnico e refinamento estético.

O impacto foi imediato. O nylon tornou-se sinônimo da Prada, consolidando a marca como pioneira de um novo vocabulário do luxo, com uma sutileza única, transitando entre a tecnologia e mantendo o padrão nos cortes e modelagens da grife. O ano também foi simbólico no plano empresarial, já que em 1999 o grupo Prada adquiriu a Jil Sander, consolidando uma estratégia de expansão que se apoiava na estética minimalista e técnica como linguagem dominante.
“De repente, o nylon passou a ser mais intrigante para mim do que as fábricas de alta cultura. Eu decidi introduzir isso nas passarelas, e desafiou, até mudou, as ideias tradicionais e conservadores do luxo.” Miuccia Prada declarou.
A lógica de transformar o utilitário em luxo pavimentou caminho para movimentos posteriores, como a aproximação entre moda e sportswear nos anos 2000 e o diálogo com o techwear cada vez mais abrupto nas décadas seguintes.

Essa trajetória também abriu espaço para novas discussões contemporâneas. Em 2019, a Prada lançou o projeto Re-Nylon, feito a partir do ECONYL, um nylon regenerado produzido a partir de resíduos plásticos como redes de pesca e carpetes descartados.
A ideia era substituir gradualmente todo o nylon virgem da marca por essa versão reciclada. Esse movimento de sustentabilidade só reforça o peso histórico do nylon dentro da Prada. O material que em 1999 já havia sido ressignificado como luxo agora se tornava também plataforma para refletir sobre os rumos da moda em um cenário de crise ambiental.
O que nasceu nos anos 1930 como símbolo de modernidade industrial, atravessou a guerra como instrumento de sobrevivência e se banalizou no consumo de massa, foi retomado por Miuccia Prada como um gesto de subversão.
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