"Eu Nem Faço Rap, faço fotografia": uma conversa com João Medeiros

17 de out. de 2023

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João está expondo no Museu da Imagem e do Som, o MIS, em São Paulo. Chamada “Eu Nem Faço Rap”, a exposição acompanha a cena do rap nacional pelos olhos do artista. As imagens se tornam determinantes no registro de um movimento que cresce cada vez mais no Brasil e, também, no mundo.


Conversamos um pouco com ele sobre sua primeira exposição solo e sobre seu trabalho num geral. Confira abaixo:

1- O nome da exposição diz “Eu nem faço rap”, mas, você é íntimo dele e, apesar de tudo, você acompanha artistas e eventos do meio. Como você acha que, sendo quem você é (fotógrafo e também jornalista), contribui para a cena?

O lance com o nome da exposição é um pouco esse, afirmar que eu não faço rap — eu faço fotografia — e que não estou apenas à serviço de rappers e artistas, mas sim colaborando com eles, sendo eu mesmo, também, um artista. O objetivo é que a pessoa que esteja indo ver a exposição, veja uma exposição do meu trabalho de fotografia, e não somente fotos de pessoas famosas, sabe? E pela recepção, esse objetivo tem sido atingido. Hoje posso falar que meu trabalho tem inovação e originalidade, como o próprio MIS descreve e, acima de tudo, identidade única. Como fotógrafo e jornalista, acredito que contribuo objetivamente para o registro de uma época efervescente no Brasil de um dos fenômenos mais poderosos do mundo que é a música rap que, num sentido maior, é um desdobramento da tradição de oralidade de várias culturas do sul global, especialmente africanas. Tenho certeza que no futuro, minhas palavras e imagens sobre o que está acontecendo ganharão ainda mais potência.

2- Ao longo desses anos, você vem ocupando lugares e expondo seu olhar, assim como o próprio rap. Qual é seu relacionamento com ele e o que você busca transmitir com suas fotografias?

Rap é uma grande parte da minha vida, não há um dia em que eu passe sem escutar rap — é um relacionamento muito íntimo e apaixonado, que acredito que se traduz nas minhas fotografias. Nessa série em específico, que é focada em retratos de rappers, tento trazer essas pessoas que frequentemente são colocadas nessa posição endeusada de ídolo, para um patamar mais humano e, consequentemente, mais vulnerável. Fazer rap frequentemente é vestir uma capa de super-herói, ou uma máscara de vilão, ou uma ironia de anti-herói, e eu quero humanizar essas pessoas e criar uma janela em que o público possa ver o lado mais humano desses artistas, numa intimidade que só é construída tempo e respeito mútuo.


3- Como você acha que suas fotografias podem desafiar os estereótipos criados em volta da cultura do rap, muitas vezes marginalizada?

Acredito que boa parte da resposta para essa pergunta esteja na resposta anterior! O grande problema dos estereótipos é que eles são a única história contada sobre um grupo, a ponto de se tornar "verdade" no senso comum e marginalizar esses grupos. Acredito que, para desafiar qualquer estereótipo, é preciso que sejam contadas histórias de maior pluralidade possível e de preferência pelas pessoas que vivem essas histórias.

4- Sua pesquisa permeia as diferentes formas de expressão da juventude brasileira. Como você acha que essa exposição colabora para a compreensão do rap brasileiro, seus artistas e obras?

A "Eu Nem Faço Rap" é uma parcela pequena do que é o rap hoje no Brasil, mas acredito que colabora na compreensão de quem são alguns dos principais nomes da cena hoje. O Rap também sempre foi uma coisa de identificação, então, o visual é extremamente importante. Minhas fotos registram muito isso, também: como rappers se vestem, se portam... No Brasil acho que os rappers ainda subestimam muito o poder de suas próprias imagens, salvo exceções, não se preocupam muito em ter boas fotos pra longevidade, que comunique quem e como eles imageticamente em uma determinada época...